Comunicado a propósito do artigo de Paula Teixeira da Cruz


A advogada e ex-ministra da Justiça Dra. Paula Teixeira da Cruz escreveu um texto no jornal Público onde critica de forma veemente os utilizadores de bicicletas e trotinetas, pois segundo a sua opinião, deslocam-se sobre os espaços pedonais sem qualquer respeito pelos peões.

O Passeio Livre congratula de forma veemente a Dra. Paula Teixeira da Cruz por demonstrar apreço pelos peões e a sua segurança, pois em última análise somos todos peões, contudo denotamos que a articulista, talvez devido a uma cegueira selectiva em relação ao status quo automobilístico, não consegue observar o “elefante na sala” e por conseguinte discernir sobre qual o verdadeiro perigo que enfrentam os peões e os demais utilizadores dos espaços pedonais.

De entre os 5652 peões atropelados em 2018, dos quais cerca de metade estavam no passeio ou a atravessar uma passagem sinalizada, sendo que 105 morreram (fonte: PORDATA e ANSR), quantos terão sido mortos por utilizadores de trotinetas e bicicletas? Diríamos que nenhum ou no máximo 1 ou 2. E no longo texto da articulista não se denota nenhuma crítica ou preocupação relativas ao verdadeiro perigo que representa o automóvel contra a segurança diária dos peões; nem relativas ao perigo, aliás, que o automóvel representa para os próprios utilizadores de bicicleta, visto que cerca de 2000 foram mortos ou feridos no mesmo ano. Pelo contrário, manifesta-se no referido texto apenas o descontentamento pela indevida usurpação do espaço pedonal por parte de utilizadores de bicicletas e trotinetas. Também não se preocupa a articulista com a usurpação, essa sim muito mais perigosa e mais espaçosa, dos passeios devido ao estacionamento ilegal de veículos automóveis.

Se é verdade que o texto de Paula Teixeira da Cruz evoca pontos importantes, pois há desrespeito por parte de utilizadores de bicicletas e trotinetas em relação ao espaço pedonal, e por isso congratulamo-la por alertar a opinião pública, também não deixa de ser estranho que a ex-ministra da justiça, conhecendo bem as estatísticas do flagelo rodoviário português, tenha escolhido escrever um texto de indignação selectiva, tendo-se esquecido de mencionar os automóveis e todos os males que estes causam ao peão e à sua segurança. A resposta para este paradoxo pode ser oferecida pela psicologia: Paula Teixeira da Cruz é certamente também automobilista, o que talvez explique a falta de empatia por utilizadores que arriscam a vida todos os dias e contribuem assim para termos cidades mais limpas e aprazíveis.

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